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Irmãs garantem subsistência e crescimento de renda com agroecologia

Irmãs garantem subsistência e crescimento de renda com agroecologiaCleonice (dir.) e Andréa mantêm a sustentabilidade do sítio onde moram. Foto: Arquivo pessoal

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Por André Garcia

O despertar do relógio, todo dia às 5h, anuncia para Cleonice Rocha de Paula o início da tripla jornada. Produtora rural, professora e dona de casa, ela divide com a irmã, Andrea Rocha de Paula, a missão de manter sustentável o pequeno sítio da família, localizado no assentamento 12 de Outubro, em Claudia (475 km de Cuiabá). Para garantir a subsistência e incrementar a renda mensal, a dupla vem contando com a agroecologia.  No mês, em que se celebra o Dia Internacional da Mulher,  o Gigante 163 quer revelar um pouco mais dessas agricultoras.

Hoje com 44 anos, Cleonice veio de Minas Gerais para Mato Grosso ainda criança, em 1984, quando a família de pequenos agricultores seguiu rumo à Nova Canaã do Norte (700 km da Capital) em busca de uma vida melhor. Bem mais tarde, em 2007, conseguiu por meio da reforma agrária seu próprio pedaço de terra, onde produz há nove anos. Neste espaço, há cerca de três anos, ela começou a revolução do sistema agroflorestal (SAF).

Cheguei aqui sozinha. Depois trouxe minha mãe, que já faleceu, e depois vieram minha irmã, meu irmão e mais três sobrinhos. Sempre moramos em sítio, mas antes éramos empregados. Aqui só eu e minha irmã que colocamos a mão na massa, porque meu irmão não pode contribuir nessa parte. Não tem como ter um sítio e não produzir nada.”

Cleonice com a sobrinha Ana. Foto: Arquivo pessoal

Pensando assim ela tem trazido mais qualidade de vida à família, que teve aumento de 70% na renda advinda do sítio, com lucro de mais ou menos R$ 2 mil por mês a partir da diversificação e comercialização da produção. A estratégia resulta ainda em uma economia de  cerca de R$1700 mensais, antes gastos com a alimentação do do dia-a-dia.

“Quase tudo que a gente come é produzido aqui mesmo: as frutas, as verduras, o queijo, a manteiga. Não comemos margarina, por exemplo. Até a manteiga que usamos para fazer bolo, cuca e pão, é feita por nós. Só compramos o que não tem aqui. Hoje temos 11 cabeças de gado,  criação de porcos e galinhas. Então, na verdade, o que a gente vende na feira é o excedente do que produzimos para nossa alimentação.”

Livre de agrotóxicos e ultraprocessados, Cleonice observa que a saúde dos familiares também melhorou. “Se for colocar tudo no papel, estamos tendo menos gastos até com remédios.”

Jornada tripla 

A rotina não é moleza. Andrea, 42, também se desdobra como produtora rural e secretária, o que faz com que a lida no campo se dê às prestações: um pouco antes de saírem para o trabalho, um pouco no horário do almoço e um pouco depois que chegam, por volta de 18h30. No final de semana a labuta continua e, com tanto trabalho, sobra até para as crianças, de 12, 7 e 5 anos, que já realizam pequenas tarefas.

“Cedo, antes de ir para a escola, eu vou cuidar da horta, que é a minha parte. Minha irmã fica com a parte de tirar o leite. Lá pelas 11h, quando venho almoçar, eu volto para a horta e fico até mais ou menos umas 13h. É bem cansativo, mas, por exemplo, quando o dia é muito estressante na escola, eu sinto que minha energia melhora quando vou para a horta”, diz Cleonice.

Projeto ajudou a aprimorar técnicas

Todo esse esforço passou a dar mais resultados quando elas conheceram o Projeto Gaia – Rede de Cooperação para a Sustentabilidade. Por meio dele, pesquisadores e extensionistas da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), da Embrapa e da Escola Técnica Estadual de Sinop ajudam a aprimorar técnicas de cultivo e promovem a independência de agrotóxicos e adubos químicos.

“Não temos condições de comprar agrotóxico nem adubo, então é a gente mesmo que faz o fertilizante líquido com esterco, açúcar mascavo e pó de rocha. A gente se adapta com o que tem no sítio e isso traz um resultado melhor para a hortaliça. Os técnicos também nos orientaram sobre a irrigação e o cultivo protegido na época da chuva, então hoje temos mais árvores frutíferas”, diz Cleonice.

Diversificação é o segredo

Com foco nos eixos social, ambiental e econômico, o Gaia também estimula a criação de abelhas sem ferrão, mostrando a importância e os benefícios dos serviços ecossistêmicos prestados pelos insetos na propriedade. A aplicação desta e de outras  diferentes técnicas  em várias frentes de produção se traduz em uma palavra: diversificação.

“O projeto ofereceu métodos mais adequados e mostrou para nós a importância da diversificação.  A gente descobriu que na mesma horta onde antes tínhamos só alface, podíamos ter também cenoura, alface, almeirão…”

Também foi assim que elas ampliaram a oferta na Feira Cantasol, que acontece no campus da Unemat de Sinop.  Feitos por antecedência por meio de um site, os pedidos de leite, queijo, galinha caipira, frutas, legumes e hortaliças são entregues aos consumidores todos os sábados.

“Quando começamos, muitas pessoas tiveram dúvida se íamos mesmo conseguir produzir, por sermos só duas mulheres. Hoje somos uma das propriedades que mais vendem na feira. Quando participamos dos cursos e palestras sempre usam nossa família como exemplo. Isso é um motivo de orgulho para nós.”

Futuro no campo

Sobre o futuro no campo, a produtora é realista ao falar sobre as barreiras enfrentadas pelas mulheres, que ainda são minoria produzindo. Sua fala, contudo, carrega esperança, especialmente quando usa o exemplo da filha, Sarah de Paula Silva, 18, que se mudou no último ano para Sinop (480 km de Cuiabá) para cursar Agronomia na UFMT.

“Toda vida ela estudou no campo. A gente sabe que para esse jovem é um pouco complicado voltar, porque ainda falta melhorar muita coisa. Mas nossa expectativa é que eles saiam, estudem e voltem para contribuir com a comunidade, porque senão vai chegar um tempo em que a zona rural vai estar muito envelhecida. Penso que para resolver isso é preciso ter políticas de permanência”, conclui.

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