Por André Garcia
A falta de cuidado da multinacional Cargill na aquisição dos grãos que exporta pode afetar a imagem da maioria dos agricultores brasileiros, que produzem sem desmatar. Nesta quinta-feira, 4/5, a organização Client Earth mostrou que, pela primeira vez, a empresa será responsabilizada por padrões internacionais relacionados ao seu rastro de desmatamento na Floresta Amazônica, na Mata Atlântica e no Cerrado.
Conhecida por ser a maior empresa privada dos Estados Unidos, com receita anual de US $ 165 bilhões, a Cargill não estaria monitorando adequadamente as grandes quantidades de soja que comercializa, deixando de identificar e eliminar as conexões com o desmatamento e abusos aos direitos humanos que perpassam a cadeia.
De acordo com a Client Earth, isso ocorre apesar de uma série de relatórios que documentam o papel da empresa na destruição de ecossistemas vulneráveis no Brasil, bem como violações dos direitos de comunidades indígenas, afro-brasileiras e outras que dependem da floresta em pé.
Diante disso, a ClientEarth acionou a Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE), um conjunto internacional de padrões para conduta empresarial responsável.
A advogada da Client Earth, Laura Dowley, explica que a rápida expansão da produção de soja para ração animal em todo o mundo está levando os biomas brasileiros a níveis bem próximos dos chamados pontos de inflexão. Como já explicado aqui no Gigante 163, isso significa que estas áreas talvez nunca se recuperem, o que coloca o agronegócio e as comunidades que dependem delas em perigo.
“Como um dos maiores negociadores de soja que se abastecem do Brasil, a Cargill deveria estar liderando as melhores práticas do mundo para impedir que a soja ligada ao desmatamento e aos abusos dos direitos humanos inunde o mercado mundial de alimentos”, diz Laura.
Para ela, a conduta da Cargill aumenta o risco de que a carne vendida nos supermercados de todo o mundo seja resultado da chamada soja ‘suja’, o que viola o código internacional de conduta empresarial responsável.
Embora haja bons e maus profissionais em todos os setores, os bons ainda representam, invariavelmente, a maioria. O mesmo se dá com o agro. Diante disso, o setor não pode admitir que uma multinacional desta magnitude deixe de fazer a sua parte, comprando de quem desmata e, com isso, comprometendo a imagem de milhares de produtores brasileiros mundo afora.
Não é de hoje que a Cargill está envolvida em outros escândalos do tipo. Uma denúncia feita pela Mighty Earth, por exemplo, liga a soja produzida ilegalmente em Mato Grosso à empresa, que revendeu os grãos para produtores ingleses, fornecedores da rede Tesco. Resultado: o caso foi noticiado pela grande imprensa britânica e veículos especializados no varejo.
Logo, a insuficiência do programa ESG (sigla em inglês para ambiental, social e governança) adotado pela multinacional poderá comprometer a balança comercial brasileira, já que a preocupação com o desmatamento tem se materializado em leis de monitoramento de cadeias, nos países importadores. É o caso da União Europeia, que já endureceu suas normas.
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