Por André Garcia
Com um rebanho de mais de 224 milhões de cabeças de gado, o Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo. Ainda assim o setor, um dos mais importantes para a matriz econômica nacional, é marcado pela baixa tecnificação e produtividade, sendo também associado ao desmatamento e à emissão de gases de efeito estufa (GEE).
Um estudo recente encomendado pelo programa Partnerships for Forests à Agroicone mostra que o baixo índice médio da produção é determinante no contexto da conservação, já que a limitação de ganhos estimula o avanço dos desmatadores sobre as áreas de vegetação nativa. Estudo divulgado na quinta-feira pelo MapBioma, mostra como a atividade tem atingido a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal.
O assunto também foi abordado pelo cientista Carlos Nobre durante o lançamento da pesquisa do Radar Verde, indicador público de transparência na produção e comercialização de carne bovina no País.
“A pecuária brasileira tem baixíssima produtividade, com 1,3 cabeças de gado por hectare na Amazônia, onde há cerca de 96 milhões de animais. O número é igual ao dos Estados Unidos, só que eles produzem mais de cinco vezes mais com o mesmo número de cabeças de gado”, disse.
Na Amazônia, por exemplo, a criação de gado é o principal motor do desmatamento em diversos estados, estando cerca de 90% da área total desmatada coberta por pastos. A questão é que esta devastação não assegura nem metade do lucro que pode ser alcançado a partir da adoção de novas práticas.
Revertendo o cenário
O mesmo estudo da Agroícone aponta que a combinação de boas práticas agropecuárias (BPAs) voltadas à mitigação das emissões pode reverter este quadro e fazer com que a produtividade média tenha um salto de 4,6 para até 10,7 arrobas por hectare ao ano.
Considerando os investimentos em diferentes BPAs isoladamente os resultados como a genética animal, por exemplo, mostram redução 38% das emissões de GEE, com incremento de até 99% na produtividade. No caso do aumento da alimentação, a queda nas emissões é de 37%, com incremento na produtividade de até 117%.
Sobre o do pastejo rotacionado manejado, a queda nas emissões é de 35% com aumento de produtividade de 71%. O levantamento também cita outras práticas, como pastejo contínuo manejado e fornecimento de proteína adequada na dieta dos animais.
Em um cenário no qual todas essas técnicas sejam adotadas, a possibilidade de crescimento da taxa de abate é de 22% para 28,7%, o peso final sobe de 19 para 22 arrobas e o estoque animal aumenta de 1,3 para 1,7 cabeças por hectare. Há ainda redução na idade de abate de 34 para 26 meses e de taxa de desfrute de 30, 3 para 10,2.
Sombra e água fresca
Outra boa aposta é a sombra das árvores, que, como já mostrado pelo Gigante 163, é uma das formas mais baratas para garantir o ganho de peso. Neste contexto, o sistema de integração pecuária-floresta é uma boa alternativa, já que combina árvores, pastagens e animais em uma mesma área ao mesmo tempo.
“O gado adora sombra. Ele engorda 200 gramas por dia e a pecuária leiteira aumenta de 10 a 20% sua produção. Esses dados são conhecidos, mas o número de pecuaristas que chegaram a ter esses sistemas integrados não chegou ainda a 8% de toda a pecuária brasileira. Esse é um enorme desafio”, explica Carlos Nobre.
Bovinocultor x pecuarista
Segundo a Agroicone, embora existam esforços para a disseminação destas BPAs, sobretudo por parte da Embrapa, o produtor é avesso ao risco e resistente a novidades, o que torna todo o processo mais complexo. Mas só uma mudança de visão faria com que o setor deixasse de fazer parte do problema para se tornar agente crucial para a solução.
“É preciso diferenciar o pecuarista e o bovinocultor. “Bovinocultor é aquele que pratica a pecuária regenerativa e o sistema integrado lavoura-floresta, que tem altíssima produtividade e reduz muito a área total da pastagem, as cabeças de gado por hectare e recicla a pastagem”, concluiu Nobre.
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