Por André Garcia
Crucial para o futuro do Brasil, o Cerrado segue desconhecido. Uma pesquisa da iniciativa Sou Cerrado mostra que 63% da população não sabe que sem ele o País não teria água. Apesar de uma melhora em relação a 2023 (71%), o índice aponta a urgência de se colocar o bioma sob os holofotes, chamando a atenção de governos, comunidade internacional e iniciativa privada para o fortalecimento de iniciativas de conservação.
Essa é uma das estratégias que vem garantindo a redução nas taxas de desmate da Amazônia: em 2023 a queda foi de quase 50%, enquanto no Cerrado houve aumento de 43%, segundo dados do Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Ainda assim, 61% brasileiros acredita que a Floresta Amazônica foi mais desmatada que o Cerrado no período.
Entre as ações de sucesso para frear a destruição vale destacar a implantação do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), lançado pelo Governo Federal antes do PPCerrado.
Além do mais, a área de reserva legal na Floresta Amazônica é de 80%, contra apenas 20% no Cerrado. Ou seja, a devastação no Cerrado, onde a agropecuária avançou por 68% do território em quase quatro décadas, é em grande parte autorizada, o que impede a fiscalização e as autuações por parte do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Berço das águas
Realizada pela Hibou Monitoramento com mais de 1,6 mil pessoas, a pesquisa da Sou Cerrado revela ainda que 40% dos entrevistados acham que a Floresta Amazônica é o berço das águas do País, subestimando o papel estratégico do Cerrado, verdadeiro detentor deste título.
O bioma se estende por 13 estados e abriga oito das doze regiões hidrográficas brasileiras, abastecendo 6 das grandes bacias hidrográficas do Brasil (Amazônica, Araguaia/Tocantins, Atlântico Norte/Nordeste, São Francisco, Atlântico Leste e Paraná/Paraguai). Sendo assim, sua destruição ameaça o fornecimento de água para consumo humano, agricultura e geração de energia.
Além disso, é lá que nascem os rios que formam as principais bacias hidrográficas da América do Sul, e onde está o maior manancial de água doce subterrânea transfronteiriço do mundo, o Aquífero Guarani. Para completar, o bioma abriga 5% de todas as espécies no mundo e 30% da biodiversidade do Brasil.
Relação de dependência
Isso significa que, se o Cerrado morrer, metade da Amazônia morre junto, acabando também a água do País. Como já mostramos, eles são codependentes e mantém uma relação simbiótica da qual depende a manutenção do clima, do ciclo dos rios e da segurança econômica, conforme explicado pelo pesquisador titular do INPE, Carlos Nobre, em entrevista publicada pelo Gigante 163 no Dia Mundial da Água.
Junto com o Pantanal, os dois biomas se abastecem mutuamente, tanto “bombeando” a água das bacias hidrográficas de um para o outro, quanto por meio dos rios voadores.
“É uma dinâmica muito complexa e muito perigosa é a degradação da Amazônia, que está ficando muito próxima de um ponto de não retorno. Isso também já começou a afetar o regime de chuva do Cerrado, principalmente no centro sul, que é a área mais desmatada do bioma. Esse é um aspecto diretamente relacionado com o desmatamento”, destacou Nobre.
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