Por Vinicius Marques
Por mais comum que a infestação de mosca branca aconteça ao longo do ciclo produtivo da soja, sua ocorrência sempre gera preocupação. O inseto, para essa cultura em específico, é danoso quando ainda está em sua fase jovem, a ninfa, e se prolifera na parte inferior da folha. Em Mato Grosso, foi possível observar os adultos do inseto nas áreas plantadas mais precocemente na safra de soja 2021/22.
Conversamos com Edson Hirose, agrônomo e pesquisador do Embrapa-Soja, para entendermos melhor como lidar com a infestação de mosca branca nas safras de soja. Confira!
Em quais estágios das culturas de soja a ocorrência da mosca branca é mais alta?
Praticamente enquanto houver folhas verdes, mesmo no início da lavoura. Mas não é a presença dela que vai te causar prejuízo. É impossível você ter uma lavoura estéril. O problema é realmente se a população crescer a um nível que te cause prejuízo.
Quais fatores contribuem para o aumento da população?
Basicamente há dois tipos de fatores: bióticos e abióticos. Os fatores bióticos têm a ver com aquilo que tem vida, como hospedeiros, doenças e desequilíbrio da fauna. Já os fatores abióticos têm a ver com o clima. Temperatura, umidade, pluviosidade etc. Condições secas com alta temperatura favorecem o desenvolvimento da mosca branca.
Como o produtor pode barrar o crescimento exponencial da população de moscas brancas?
Reduzindo a utilização de inseticidas sem uma necessidade específica. O que a gente preconiza muito, dentro do manejo integrado de pragas, é a utilização de químico no momento e na quantidade desnecessária. Você deve utilizar os produtos adequados no momento certo. Existem vários inseticidas que são específicos para o controle da mosca branca. Se você fizer isso de forma adequada, você já conserva uma série de inimigos naturais que vão ajudar a gerar uma barreira para o desenvolvimento dessa população. Tem um predador. Então, ao invés de ter cem ovos, o predador come noventa ovos. Os inimigos naturais podem ser doenças fúngicas, parasitóides de ninfas (o gênero mais conhecido chama-se Encarsia) e predadores. Há várias moscas que são capazes de predar as ninfas.
Quais são os principais danos causados pela mosca branca, no caso, pelas ninfas, nas produções de soja?
A ninfa faz a sucção da seiva da planta, deixando-a debilitada. Além disso, a mosca branca elimina parte do açúcar que ela retira, expelindo-o nas folhas de baixo. Esse açúcar é um meio de cultura onde um fungo chamado de fumagina é capaz de se desenvolver. Não são fungos patogênicos para a soja, mas cresce em cima desse meio de cultura. Ao crescer, ele acaba cobrindo parte da folha, reduzindo a área fotossintética da planta e diminuindo a produtividade.
Como o produtor se livra da fumagina, uma vez que já se espalhou pela plantação?
Na verdade, ele não consegue se livrar. A fumagina só ocorre quando há populações muito altas de mosca branca. É preciso de três a quatro ninfas por centímetro quadrado para gerar esse fungo. As moscas brancas geralmente aparecem nas bordaduras das plantações. Você não vai ter uma população alta no meio da lavoura, sem antes ter na bordadura. Então é necessário que o produtor monitore as bordaduras e inclusive direcione a pulverização de inseticidas, dependendo da condição, em áreas com maior infestação.
E como prevenir seu crescimento excessivo?
Plantar nas condições ideais, mantendo períodos de plantio estreitos, curtos. Aí você tem a soja entrando e saindo quase ao mesmo tempo, sem aquilo que chamamos de ponte verde. Vamos imaginar que um produtor tenha um sistema de irrigação de pivô central, onde ele tenha feijão — que é um hospedeiro de mosca branca. Como ele tem sistema de irrigação, ele mantém plantas verdes, multiplicando as moscas brancas. Em setembro, ele inicia a semeadora de soja ainda com o material verde, permitindo o deslocamento da mosca branca do feijão para a soja. Agora um outro exemplo. Sojas plantadas em diferentes épocas, mas muito próximas. O que isso gera? Vamos imaginar que há condições de chuvas irregulares. No início do plantio da soja, te permitiu plantar um talhão, mas daí a chuva cortou e você teve que plantar o talhão adjacente duas semanas depois. Aí você passa para o próximo e a mesma coisa acontece. Então você estende a semeadura por um período muito longo em áreas muito próximas.
No caso, a extensão da janela de plantio da soja poderia vir a agravar esse problema?
Sim. Se você tiver, por exemplo, sojas ainda se desenvolvendo, com certeza vai ser um problema, não só de mosca branca, mas de percevejo também. Porque você simplesmente tem alimento para ela em um período em que não deveria ter. A gente fala muito da ocorrência da ferrugem, mas mosca branca, percevejo, todas essas pragas, elas viriam a reboque.
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E quanto tempo, mais ou menos, de sucção feita pela ninfa é preciso para a planta realmente ter o desenvolvimento afetado?
Quando falamos em ninfas de mosca branca, estamos falando de um inseto que tem mais ou menos dois milímetros. Mas se você tiver centenas de ninfas, isso já começa a dar problema, dependendo do estágio da planta. Por isso, estamos desenvolvendo um aplicativo, em parceria com o Hub de Inteligência Artificial do SENAI/PR, que irá promover a contagem e classificação da população jovem de moscas brancas.
E a partir do aplicativo, sabendo a contagem e a classificação das ninfas, você conseguiria saber quanto tempo você tem para agir?
Esse é o plano. O aplicativo, na verdade, faz aquilo que nós teríamos que fazer, que é contar e classificar. Você simplesmente precisará tirar uma folha, colocar em uma imagem e o computador irá contar a quantidade de ninfas para você, classificando em questão de segundos.
E em que pé está o aplicativo?
A gente fez a prova de conceito, já sabemos que é possível fazer! Agora nós estamos na parte de pesquisa, produzindo uma publicação. Depois teremos que encontrar parceiros que tenham interesse de transformar isso em um produto.