O Gigante 163 convida diversos especialistas, produtores e influenciadores para colaborar com conteúdos que interessam aos nossos leitores – profissionais do agronegócio.
Em abril, foi divulgado o terceiro de uma série de relatórios do IPCC, em que os maiores cientistas do clima avaliam os riscos das mudanças climáticas, seus possíveis impactos e as opções disponíveis de mitigação e adaptação com vistas a um planeta mais saudável. Também comemoramos o Dia da Terra e, como somos um povo que tem orgulho deste solo fértil de Mato Grosso e do Brasil, esse será um dos nossos focos no Gigante 163 neste mês.
Para nos ajudar a trabalhar em um futuro sustentável para o agro, chamamos Dr. Luiz Gustavo O. Denardin, engenheiro agrônomo, especialista em ciência do solo e pesquisador da Universidade Federal de Rondonópolis, para falar sobre os efeitos que as mudanças climáticas podem ter na nossa produção de Mato Grosso. Este é o segundo artigo do Dr. Luiz em nosso site (encontre o primeiro aqui, sobre as mudanças climáticas e a produção do milho e algodão no MT), onde ele conta mais sobre os benefícios da integração de produção agropecuária, e como isso ajuda o produtor – e o planeta!
Confira sua análise e sugestões de melhores caminhos para o futuro da agropecuária mato-grossense no artigo abaixo.
Os solos brasileiros são caracterizados pela baixa fertilidade natural. Isso se deve às características climáticas onde se encontram – climas tropicais e subtropicais – que potencializam o processo de intemperização, favorecendo a perda de nutrientes e também altas taxas de decomposição da matéria orgânica. Por outro lado, o mesmo clima favorece um alto potencial de produção agrícola, com possibilidade de cultivar culturas agrícolas o ano todo.
Nesse cenário, é imprescindível a adoção de sistemas de manejo conservacionistas do solo embasados no não revolvimento e no alto aporte de resíduos. Essas práticas são importantes tanto na redução do processo de decomposição quanto no sequestro de carbono no solo. O plantio direto, por si só, já é amplamente conhecido mundialmente pelo potencial de redução da decomposição da matéria orgânica e de perdas por erosão. Somente a conversão do sistema convencional, com preparo do solo, para sistemas sem revolvimento (plantio direto) e alto aporte de resíduos pode apresentar taxas de acúmulo de carbono de até 0,5 t/ha ao ano.
Por outro lado, órgãos internacionais, como a Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO), uma agência das Nações Unidas, têm fomentado alternativas ainda mais eficientes em sequestrar carbono no solo. Segundo a FAO, os sistemas integrados de produção agropecuária (ex. ILP, ILPF, etc.) são alternativas viáveis de diversificação de culturas e incremento de renda ao produtor, com alto potencial de mitigar emissões de gases do efeito estufa por meio do sequestro de carbono no solo.
Esses sistemas são capazes de potencializar o sequestro de carbono sob plantio direto em até 5 vezes, chegando a taxas de acúmulo anual de até 2,6 t/ha de carbono. Por alterar a dinâmica do carbono, esses sistemas podem aumentar rapidamente o teor de matéria orgânica no solo em decorrência do alto aporte de resíduos, tanto vegetal (forragem) quanto animal aportados ao solo.
Consequentemente, a melhoria da qualidade do solo proporcionada pelos aumentos de matéria orgânica propicia aumento na produção agrícola e maior retorno econômico ao produtor.
Um dos grupos de pesquisa da Aliança SIPA – uma associação sem fins lucrativos com objetivo de fomentar os sistemas integrados no Brasil – o Grupo de Pesquisas e Inovação em Sistemas Puros e Integrados de Produção Agropecuária (GPISI), vinculado à Universidade Federal de Rondonópolis, possui dois experimentos avaliando o impacto de sistemas integrados em diferentes arranjos no Mato Grosso. Um dos experimentos, em parceria com o Instituto Mato-Grossense do Algodão, avalia diferentes alternativas para aumento da produtividade da soja e viabilização do cultivo do algodão em solos arenosos.
O experimento foi iniciado em 2017 e já revela resultados práticos interessantes. Comparado ao sistema controle tradicional com soja na safra e pousio na entressafra, o cultivo de um mix de espécies sob pastejo apresentou uma produtividade de soja em sucessão de 59 scs/ha, 11% superior ao sistema tradicional (53 scs/ha). O mix foi formado por Piatã, feijão-caupí, níger, nabo forrageiro e trigo mourisco. Além da produtividade da soja, o sistema integrado apresentou melhorias relacionadas ao teor de matéria orgânica no solo e uma produção de algodão 150% superior, com 2,5 t/ha a mais de algodão comparado ao sistema tradicional.
O segundo experimento do grupo foi iniciado em 2019, e é localizado na Fazenda Guarita, em um solo de textura média arenosa em Rondonópolis (MT). Esse experimento tem por objetivo avaliar a “adubação de sistemas” em sistemas integrados, comparado com adubação convencional com fósforo e potássio na soja, além de analisar os benefícios da adubação nitrogenada na pastagem.
Durante três anos já foi possível verificar que o desempenho animal foi potencializado tanto pela adubação fosfatada e potássica na pastagem na entressafra da soja quanto pela adubação nitrogenada no pasto.
Os resultados obtidos demonstram que a adubação nitrogenada, além da adubação com fósforo e potássio, podem ser realizadas na entressafra da soja (período de pastagem anual), permitindo uma maior lotação animal dessas áreas, intensificando a produção agropecuária de forma sustentável. Além da maior produção de pasto e consequentemente maior produção animal, essa alternativa de adubação aumenta também a produtividade da soja em sucessão em até 8 scs/ha. Esses aumentos estão sendo relacionados a melhorias em propriedades bioquímicas e biológicas do solo, acompanhadas de maiores estoques de carbono no solo.
Fontes:
- Carvalho et al. Impact of pasture, agriculture and crop-livestock systems on soil C stocks in Brazil. Soil and Tillage Research, v. 110, n. 1, p. 175-186, 2010.
- Bayer et al. Carbon sequestration in two Brazilian Cerrado soils under no-till. Soil and tillage research, v. 86, n. 2, p. 237-245, 2006.
- Banco de dados do GPISI/Aliança SIPA.