Por André Garcia
Agravada pela crise climática, a proliferação da cigarrinha-do-milho tem ligação direta com a expansão da monocultura e, principalmente, com o manejo inadequado das lavouras, o que incluiu a aplicação de agroquímicos. A situação pode ser revertida pelo fungo Cordyceps javanica, destaque de estudo publicado na revista Scientific Reports.
Embora o fungo já seja conhecido por seu alto potencial de controle sobre insetos sugadores, sendo utilizado em bioinseticidas comercializados atualmente, até agora não se sabia exatamente como ele atuava.
“Nosso trabalho evidenciou que o fungo começa a afetar o comportamento da cigarrinha-do-milho dois dias após a pulverização do bioinseticida, reduzindo a atividade alimentar dos insetos nos vasos do floema das plantas de milho, local onde ocorre a transmissão de fitopatógenos”, conta a pesquisadora Nathalie Maluta à Agência FAPESP.
Maluta afirma que a atuação do Cordyceps javanica não oferece nenhum risco ao consumidor humano ou animal, tanto que seu uso é permitido para cultivos orgânicos. Além disso, enfatiza que ele já existe e atua na natureza, não tendo sido “fabricado” em laboratório ou passado por manipulação genética.
Engenheira agrônoma, pós-doutora na área de fitossanidade e pesquisadora da Koppert Brasil, ela acrescenta que os efeitos são constatados a partir da pulverização sobre a planta, que faz com que o Cordyceps atinja os insetos. Isso cria um filme na superfície vegetal com o qual outros insetos que pousam ali terão contato.
“De uma maneira ou de outra, o fungo penetra nos corpos dos insetos. Seu efeito inseticida não é imediato. Ele precisa de alguns dias para germinar e produzir esporos, levando o inseto à morte. Mas, bem antes disso, já começa a afetar os seus comportamentos, inclusive o comportamento alimentar”, relata.
Estratégias de manejo
Não é de hoje que a cigarrinha do milho afeta as lavouras. Mas, nos últimos anos, sua população cresceu de forma explosiva, o que também está associado aos cultivos sucessivos. Hoje, para além das safras, temos as safrinhas, o que aumenta a taxa de proliferação da praga, porque ela tem disponibilidade de comida o ano todo.
Neste cenário, Maluta destaca que é preciso mudar radicalmente as estratégias de manejo.
“Ao aplicar inseticidas químicos sem prévio monitoramento e sem saber se há necessidade de entrar com alguma medida de controle, ocorre a seleção de indivíduos resistentes, uma vez que os insetos suscetíveis morrem e os resistentes permanecem no campo, até o ponto em que nenhum instrumento de controle funciona mais.
Técnica inovadora
O estudo pioneiro foi realizado no Centro de Pesquisa Avançada de São Paulo para Controle Biológico (SPARCBio), constituído pela FAPESP e pela empresa Koppert Biological Systems na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP).
Para obter esse resultado, a pesquisadora aplicou uma técnica, ainda pouco conhecida no Brasil, chamada de electrical penetration graph (EPG), na qual a cigarrinha de teste, ativa sobre a planta de milho, é conectada a um eletrodo, podendo assim ser monitorada e representada por meio de um gráfico.
“A técnica de EPG gera formas de onda com diferentes características, como nível de tensão, frequência e amplitude, que podem ser correlacionadas com atividades biológicas do inseto. Isso nos permite saber, em tempo real, o que está acontecendo com ele”, informa a pesquisadora.
Prejuízos causados pela cigarrinha
A cigarrinha-do-milho (Dalbulus maidis) está amplamente distribuída nas Américas, desde o sul dos Estados Unidos até o norte da Argentina. No Brasil, ele utiliza apenas as plantas de milho como hospedeiras e ainda são desconhecidos seus mecanismos de adaptação a outros vegetais.
No milho, o inseto causa danos pela sucção da seiva do floema, o tecido vivo através do qual circulam compostos orgânicos solúveis, em especial a sacarose. Mas esse não é o principal problema, já que ele também transmite bactérias e vírus que podem afetar a produtividade e, por decorrência, a produção do cereal.
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