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Com Terra mais quente, queimadas serão mais comuns e mais fortes

Com Terra mais quente, queimadas serão mais comuns e mais fortesAmazônia, Cerrado e Pantanal são os mais ameaçados. Foto: Bruno Kelly/Amazonia Real.

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Por André Garcia

Em um ciclo vicioso fatal, o aquecimento global, as queimadas, a falta de água e os eventos climáticos extremos criam um cenário cada vez mais dramático de destruição e prejuízos ao agro brasileiro.  Agora, com a possibilidade de que a Terra esquente 2,5°C até 2050, estes recordes podem ser superados em 2025 e seguir piorando no futuro.

A lógica é simples. Em 2024 o mundo passou o limite de 1,5°C de aquecimento previsto no Acordo de Paris, o que era esperado apenas para 2028. No período, cientistas já alertavam para a perda constante de água em diversas regiões do País, que, também no ano passado, queimou 30,8 milhões de hectares, 79% em relação a mais que em 2023.

“Estamos acostumados a colocar as mudanças climáticas no futuro, mas o aumento das temperaturas já intensificou eventos extremos. Já estamos tendo secas prolongadas e os dados mostram que, por exemplo, a segunda maior bacia do Pantanal já perdeu 50% da sua água e lá, ano após ano, a estação do fogo está cada vez mais dramática”, diz Alice Thuault, diretora executiva do Instituto Centro de Vida (ICV).

Em entrevista ao Gigante 163, ela explicou que, com a alta nos termômetros, o período de queimadas, que antes começava em agosto, passa a acontecer bem mais cedo, a partir de junho e julho. Além disso, por conta da indisponibilidade hídrica, o fogo avança para áreas que antes não eram atingidas.

“A frequência aumenta porque o período de queimada é mais longo, mas também a severidade aumenta, porque o fogo que antigamente tinha como ser controlado, hoje toma proporções maiores e atinge mais áreas”, disse.

Centro Oeste na rota do fogo

Toda esta situação deve ser ainda pior na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal, que passarão a oferecer condições mais favoráveis ao fogo, já que o calor extremo vai reduzir a umidade do solo e da vegetação. No ano passado as queimadas nestes biomas cresceram respectivamente 79%, 47% e 64% em relação a 2023.

“Isso impacta não só a agropecuária de Mato Grosso, mas a de vários lugares: os produtores pequenos, os grandes, todo mundo. Quando falamos em aumento das temperaturas e redução da água, estamos falando também em perdas socioeconômicas, principalmente em termos de produção agrícola”, avalia Thuault.

Neste cenário, a região Centro Oeste será a maior prejudicada. O pesquisador do Centro de Estudos do Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas (FGV Agro) e da Embrapa, Eduardo Assad, aponta que os termômetros devem registrar entre 4°C a 5°C acima da média histórica, o que pode, inclusive, tornar o plantio inviável em algumas áreas.

“O estado que nas nossas projeções seria mais atingido, aquele que a gente observa as maiores temperaturas, seria o Mato Grosso. Haverá também um impacto muito forte na região do estado de Goiás”, disse recentemente à reportagem.

Prejuízo

Os danos não são apenas ambientais.  Segundo a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), só entre junho e agosto de 2024, o fogo causou prejuízos de R$ 14,7 bilhões ao agronegócio. No Centro Oeste, polo do setor no País, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul tiveram as maiores perdas: R$ 2,3 bilhões e R$ 1,4 bilhões respectivamente.

Nos três meses analisados pela CNA, cerca de 8 milhões de hectares já haviam sido queimados no Brasil. Mas o pior ainda estava por vir e nos três meses seguintes mais 18 milhões de hectares foram destruídos. Embora o relatório sobre o período ainda não tenha sido publicado, a estimativa é de que os prejuízos tenham triplicado.

Há ainda as perdas relacionadas à saúde pública, uma vez que aumentam os casos de doenças respiratórias e, consequentemente, a procura por hospitais. “A qualidade do ar é o segundo fator de risco mundial de doenças pulmonares, antes do tabaco. Isso tem um grande impacto no custo da saúde pública”, acrescenta Alice.

Ciclo vicioso

As mudanças climáticas são um dos principais impulsionadores do aumento da atividade dos incêndios. De acordo com a WRI Brasil, ondas de calor extremo já são cinco vezes mais prováveis hoje do que há 150 anos e espera-se que se tornem ainda mais frequentes à medida que o planeta continue a aquecer.

Quando as florestas queimam, elas liberam o carbono armazenado nos troncos, galhos, e folhas e no solo. À medida que as queimadas se tornam maiores e mais frequentes, elas emitem mais carbono, exacerbando ainda mais as mudanças climáticas e contribuindo para mais incêndios como parte de um “ciclo de feedback incêndio-clima”.

 

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