No início do mês de março, a Organização Meteorológica Mundial (OMM), agência especializada das Nações Unidas (ONU) para a meteorologia, alertou para um possível retorno este ano do El Niño. Há uma probabilidade de 15% de o fenômeno atmosférico voltar entre abril e junho. As chances sobem para 35% entre maio e julho, e são de 55% de junho a agosto. As informações foram publicadas pela BBC News Brasil.
Relembrando o El Niño
O El Niño provoca um aquecimento fora do normal das águas do Oceano Pacífico na mesma região do La Ninã, elevando as temperaturas globais. No Brasil, entre 2015 e 2016 sua passagem intensificou a seca no Nordeste e provocou estiagem prolongada no Norte, centro-norte de Minas e de Goiás e no Distrito Federal. Além disso, houve fortes inundações no Sul, e impactos sobre o setor elétrico e a produção de alimentos.
Nos últimos três anos, o planeta esteve sob influência do La Niña, que esfria as águas do Pacífico na parte equatorial e contribuiu para frear temporariamente o aumento das temperaturas no planeta, segundo o secretário-geral da OMM, Petteri Taalas. Mas é importante lembrar que as mudanças climáticas já impactam o mundo e os últimos oito anos foram alguns dos mais quentes já registrados.
O que o agronegócio pode esperar?
De acordo com a reportagem, os analistas são cautelosos em apontar possíveis impactos do El Niño na produção agrícola brasileira, já que ainda não é possível saber qual será a intensidade do fenômeno que pode ter início esse ano. No entanto, com base na ocorrência do evento climático no passado, é possível obter algumas pistas.
Um dos cultivos que podem ser afetados é o do café, segundo Natália Gandolphi, analista da consultoria HedgePoint Global Markets. Um dos motivos é que o fenômenos provoca um inverno mais quente, prejudicando o desenvolvimento vegetativo do pé de café.
“No geral, quando observamos os eventos de El Niño, há uma redução média de 5% na produção de (café do tipo) Arábica”, disse à BBC.
Na cultura de cana-de-açúcar, o pico da safra no Brasil ocorre entre abril e agosto. Se vier um El Niño forte, ele pode levar a um inverno mais úmido. Isso é ruim para o ritmo da safra de açúcar.
Lívea Coda, analista de açúcar e etanol da HedgePointse, reiterou que se o fenômeno se estender de dezembro a fevereiro, a precipitação no Centro-Sul pode diminuir, principalmente no norte de São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, comprometendo a próxima safra.
Pedro Schicchi, analista de grãos e proteína animal da mesma consultoria, explica que um inverno mais úmido pode ser benéfico para a safra de milho de inverno no Mato Grosso e Goiás.
“Uma maior produção de milho pode reduzir o custo da ração para produtores de frango e suínos”, afirmou.
O evento também pode favorecer a safra de soja no Sul do país, com maior volume de chuvas, embora possa prejudicar o grão no Centro-Oeste, devido ao tempo mais seco.
“Se a chuva realmente vier e tivermos maior produção de milho, isso pode reduzir o custo da ração para os produtores de frango e suínos”, disse Schicchi.
Ele ponderou que para o gado bovino, a chuva amplia a área de pastagem. Então, o efeito também pode ser positivo. Mas lembrou que isso pode não necessariamente impactar o consumidor final.
Setor elétrico
No Brasil, os principais reservatórios hidrelétricos ficam nas regiões Sudeste e central do país. Para o setor, o La Niña é melhor.
“O El Niño favorece um tempo mais quente e seco na porção centro-norte do país e, por isso, não costuma ser positivo para a manutenção dos reservatórios de energia”, explicou o meteorologista Filipe Pungirum, mestre em Clima pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
O fenômeno também costuma elevar as temperaturas nas capitais, pressionando a demanda, já que o ar condicionado se tornou o principal fator de pico do consumo elétrico nacional.
Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), os reservatórios do Sudeste e Centro-Oeste encerraram fevereiro em patamares superiores a 70%, maior nível desde 2012. Enquanto no Sul e Nordeste, os níveis estão acima de 80%, e no Norte, em quase 100%.
“Mesmo se esse próximo El Niño for bem rigoroso e tivermos poucas chuvas, não vai ser tão grave quanto nas últimas crises”, finalizou o especialista.