As florestas tropicais têm um papel fundamental nos esforços mundiais para se alcançar as reduções de emissões e no enfrentamento às mudanças climáticas. Para que elas exerçam seu papel, no entanto, é preciso recursos financeiros, não apenas para conservá-las, mas também para restaurar boa parte delas.
É o tal do financiamento climático, que mobiliza empresas, governos nacionais e internacionais tanto na busca dessas verbas, como na criação de políticas públicas para alcançar resultados. O grande desafio é a distribuição desses recursos, que existem aos bilhões de dólares e, na maioria das vezes, não chegam onde deveria.
Essa foi a questão central do painel “O papel do financiamento global do clima na proteção das florestas tropicais”, promovido pela Brazil Climate Hub, neste sábado, 12/11, na Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP27), que acontece no Egito.
Juliana Santiago, da Emergent, organização especializada em captar recursos para financiamentos climáticos, lembrou que o Brasil foi pioneiro na ideia de pensar uma forma de pagamento por serviços ambientais, com a criação Fundo Amazônia.
A partir dele, muitas outras inciativas foram criadas. Mato Grosso, por exemplo, se beneficia de várias delas, entre as quais o Programa REM e outros investimentos, que conta com parceiros como o Banco Mundial, BID, e fundos privados.
Mas nem todos conseguem acessar os recursos, caso dos povos originários.
“A despeito do reconhecimento científico mundial do papel dos povos indígenas no enfretamento das mudanças climáticas, nós enfrentamos um problema global que é a dificuldade de o recurso chegar aos povos indígenas”, disse Leila Saraiva, Conselheira Política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).
De acordo come ela, um estudo da Rainforest Foundation mostra que apenas 1% de toda ajuda oficial para o desenvolvimento de enfrentamento das mudanças climáticas chegou aos povos originários. Da mesma forma, do total de 1.7 bilhão de dólares do fundo acordado na COP26 para este fim, apenas 19% deste total foram gastos, e somente 7% teve como destino projetos que incluíam essa comunidade.
Leila defendeu um olhar não colonial para os povos indígenas e seu Planos de Gestão Territorial e Ambiental (PGTAs), que são medidas de mitigação e de perdas e danos que atendem aos requisitos de proteção e gestão ambiental dos financiadores.
“Existem mais de 200 PGTAs já elaborados no Brasil, formulados coletivamente pelas comunidades. Uma ferramenta que precisa acessar esses recursos”, diz.
Financiar os PGTA seria, para Leila, uma demonstração de respeito aos modos de vida dos indígenas, e o reconhecimento do papel deles como protagonista no enfrentamento das mudanças climáticas.
“As PGTA refletem processos comunitários, tem efetividade, e não precisam introduzir ferramenta de mercado. Apostar em planos como esse é também apostar que se consegue aproveitar o financiamento climático sem ter que interferir na lógica nas comunidades”, diz
Mas quanto custa financiar a implementação de PGTAs?
Para proteger 150 mil km2, equivalente ao território da Grécia, são necessários menos de US$ 1 milhão por ano, segundo estudos da Inesc.
“O benefício é grande comparado ao investimento. E ainda dando autonomia povos indígenas”, afirma.
Juliana Santiago defendeu a revisão dos métodos de financiamento.
“Não podemos criar processos com padrão suíço para uma realidade amazônica. Vivemos em um país que não conhece e reconhece as florestas e a diversidade étnica e indígena, isso é uma hipocrisia”, afirmou.
Para o diretor de Políticas Públicas e Desenvolvimento Territorial do IPAM, Eugênio Pantoja, e moderador do painel, “precisamos reconstruir nosso futuro. E faremos isso entendendo que atingir nossos objetivos estabelecidos no Acordo de Paris passa pela preservação da Amazônia e pela colaboração com os povos tradicionais”.