Por André Garcia
A reinserção de pequenos produtores à cadeia pecuária, excluídos após a constatação de crimes ambientais em suas propriedades, pode aumentar o número de cabeças de gado por área e assegurar a sustentabilidade produtiva, duas peças-chaves para o alcance das metas de Mato Grosso na redução das emissões de gases do efeito estufa (GEE).
Isso porque, para voltar à legalidade, os infratores passam a adotar uma gestão voltada às boas práticas ambientais, investindo, por exemplo, na intensificação e na recuperação de áreas degradadas, ações que garantem sua lucratividade. Assim também esvaziam a justificativa de desmate por motivação financeira.
A medida tem mais impacto entre os pequenos pecuaristas, principais atingidos por embargos de frigoríficos no cumprimento de exigências que garantam a rastreabilidade do gado. Esta também é uma das estratégias de Mato Grosso, maior exportador de carne do país, para alcançar investimentos do exigente mercado da Europa.
“Se ele está sendo muito mais produtivo, não precisa se preocupar em abrir novas áreas. Simplesmente vai produzir com melhor qualidade, com maior quantidade de carne por carcaça e vai ser melhor remunerado por isso”, disse o presidente do Instituto Mato-grossense da Carne (Imac), Caio Penido
O assunto foi discutido no painel “Sistemas sustentáveis de produção pecuária e reinserção ambiental de pequenos produtores em Mato Grosso”, realizado pelo Consórcio Amazônia Legal, na Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 27), no Egito, na quinta-feira, 17/11.
Ao cobrar por mais parcerias (leia-se recursos) e menos imposições do continente europeu, Penido reforçou o coro de representantes do Estado que, ao longo do evento, vem insistindo na afirmação de que a carne mato-grossense é a mais sustentável do mundo.
“Esse produtor muitas vezes está no assentamento, duplamente embargado. Isso pode significar sua exclusão da cadeia e, fora do radar, ele fica propenso à ilegalidade porque vai desmatar para fazer dinheiro rápido e vai entrar para o mercado informal”, aponta o presidente da Imac.
A importância desse olhar para os pequenos produtores fica melhor ilustrada pelas porcentagens: no Estado, 74% dos pecuaristas têm até 59 animais, enquanto 8% possuem mais de 1.980 cabeças. Ou seja, a concentração implica em um processo de regularização mais inclusivo e que leva em consideração também a gestão ambiental.
“Se tiver incentivo econômico e for mesmo um produtor, não for um especulador de terra ou um herdeiro esperando para vender, ele [pecuarista], ao ter acesso a crédito, vai contratar uma consultoria ambiental, assistência técnica, vender melhor a carne e ter retorno financeiro melhor”, afirmou Caio.
Negociações
De acordo com Penido, embora a Europa apresente certa abertura para a questão dos pequenos pecuaristas, é preciso que o continente contribua com a implementação do Código Florestal no Brasil, estimulando a redução do desmatamento ilegal reduzido por meio de mecanismos econômicos.
“Não queremos esmola, queremos parceria em projetos de campanha e, sobretudo, um mercado justo”, diz Caio.
O cenário melhora quando se trata da China, maior parceira comercial de Mato Grosso. Graças a uma exigência do país asiático, o abate de animais com menos de 24 meses subiu de 19 para 37% em dois anos, o que reduz as emissões de metano por arroba produzida e tem efeito positivo colateral na qualidade da carne.
“Não precisa de imposição ou boicote. Esse é o tipo de tecnologia que tem que fomentar entre os pequenos e médios produtores.”
Valor na floresta
Acordos assim ajudam a criar valor econômico para a floresta que, na avaliação de Penido, do ponto de vista financeiro, oferecem ônus com os custos de conservação.
O potencial de Mato Grosso também está ligado à recuperação, já que as áreas de pastagem equivalem a 20 milhões de hectares, dos quais aproximadamente 12 milhões têm grau de degradação avançado. Isso indica para chances de avançar na pauta, apostando em tecnologia e incentivando o produtor a intensificar produção.
Resolvendo o problema da recuperação de áreas degradadas seriam reduzidas ainda os 98% de bloqueios nas listas dos frigoríficos inscritos no programa Carne Legal, fruto de termo de ajustamento de conduta (TAC) firmado entre o Ministério Público Federal de Mato Grosso (MPF-MT) e os frigoríficos locais.
Para o procurador da República Erich Masson, a reinserção de um pecuarista que estava à margem aliada à recuperação de áreas degradadas garante ainda o sequestro de grandes quantidades de carbono.
“A recuperação de áreas degradadas permite que a pessoa volte a vender. Se o produtor se reinseriu e está executando a recuperação da área, a gente pode avançar mais e chegar na regularização total ambiental”, concluiu.
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