Por André Garcia
A fumaça dos incêndios florestais na América do Sul foi responsável por cerca de 12 mil mortes prematuras a cada ano de 2014 a 2019 —55% dessas mortes ocorreram no Brasil. A taxa tem relação com os impactos à saúde humana causados pelo contato com minúsculas partículas de fumaça de até 2,5 micrômetros de tamanho (MP2,5).
É o que aponta um novo estudo publicado na revista Environmental Research Health, que também destaca regiões no Peru, Bolívia e Brasil como os principais focos específicos da exposição, com taxas de mortalidade seis vezes maiores que a da população em geral.
O contato com a fumaça é muito maior durante a estação seca, quando os incêndios florestais se multiplicam e podem mais do que dobrar o aumento nas concentrações de MP2,5. No caso do Cerrado, bioma mais afetado pelo fogo em Mato Grosso, o período se estende de maio a setembro.
Um alerta para para o Estado, que, desde abril está em emergência ambiental, determinada pelo Governo Federal. A classificação, prevista em portaria assinada pela ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, engloba outros 18 Estados e o Distrito Federal.
O Estado respondeu sozinho por quase 20% dos focos de queimadas registrados no Brasil nos dois primeiros meses deste ano, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Como já noticiado pelo Gigante 163, partículas de fumaça das queimadas na Amazônia percorrem grandes distâncias, afetando a qualidade do ar em vários países da América do Sul. Para entender o movimento, basta lembrar de quando os incêndios no bioma, ao norte de Mato Grosso, alcançaram a população de Cuiabá e de São Paulo.
De acordo com publicação da Folha de São Paulo da segunda-feira, 8/5, para chegar aos dados do estudo do Environmental Research Health, os pesquisadores usaram uma combinação de modelos de transporte de partículas na atmosfera e medidas de concentração de MP2,5 para estimar a taxa de mortalidade prematura, ao invés de analisar dados de internação hospitalar.
O estudo mostra ainda que os povos indígenas têm duas vezes mais chances de morrer prematuramente devido à exposição à fumaça das queimadas do que a população sul-americana em geral. Como o acesso a serviços de saúde por estas populações ainda é limitado, os números podem ser ainda maiores.
Como o corpo reage
Em 2022, durante o período mais crítico de queimadas, a médica de saúde da família Marina Koscheck falou à reportagem sobre os riscos da inalação de fumaça.
Sintomas que começam como tosse e dificuldade respiratória podem agravar e prejudicar os pulmões, os vasos sanguíneos e o sistema imunológico, resultando em um processo inflamatório generalizado que pode causar a morte.
Isso ocorre porque, na fumaça da queimada, são encontrados monóxido de carbono (CO) e materiais particulados, que ficam no ar após os incêndios.
Tecnicamente falando, essas minúsculas partículas percorrem o sistema respiratório e transpõem a barreira epitelial (a pele que reveste os órgãos internos), atingindo os alvéolos pulmonares durante as trocas gasosas, chegando até a corrente sanguínea.
Queimadas em ascensão
A taxa de queimadas na América do Sul aumentou nos últimos anos. Esse crescimento é impulsionado pela degradação florestal devido à atividade humana, em grande parte de forma ilegal, como mineração, extração de madeira e uso da terra para diversos fins agrícolas.
No Brasil, dados recentes do Mapbiomas mostram que a Amazônia concentra 44,6% da área queimada no Brasil entre 1985 e 2022. Cerca de 44% dessa área foi de vegetação nativa e 56% em áreas de pastagem. A área queimada de duas a quatro vezes no bioma correspondeu a 47%, enquanto a que queimou cinco ou mais vezes no período é de 21%.
Neste contexto, Mato Grosso foi o estado que mais queimou entre 1985 e 2022, conforme um levantamento divulgado pelo MapBiomas no final de abril. Baseado em imagens de satélite, o estudo aponta que o estado teve 43,2 milhões de hectares destruídos pelo fogo no período, o que representa 47,8% de seu território.
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