Em decisão liminar proferida na sexta-feira, 12/8, a Justiça Federal no Mato Grosso determinou que os povos indígenas Boe Bororo sejam ouvidos sobre a construção da ferrovia que vai ligar Rondonópolis a Lucas do Rio Verde (sudeste ao norte de Mato Grosso), antes da emissão de novas licenças para as obras.
A decisão, que atende um pedido do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU), também obriga a Fundação Nacional do Índio (Funai) a intervir no processo de licenciamento ambiental do empreendimento para concretizar a consulta aos povos em até 90 dias.
De acordo com reportagem do G1, o objetivo é assegurar que as comunidades indígenas que habitam o entorno da região não sejam afetadas negativamente pelo empreendimento.
O traçado da ferrovia está previsto para passar entre as Terras Indígenas Tereza Cristina e Tadarimana, ambas povoadas pelos indígenas da etnia Boe Bororo.
A Justiça também ordenou que a empresa Rumo Malha Norte S/A, responsável pelas obras, adote as medidas para proceder com os estudos do componente indígena e ajude a viabilizar a audiência junto às comunidades envolvidas.
“O Povo Boe Bororo não foi consultado para a construção da ferrovia passando por suas terras ancestrais, o que fere não apenas os direitos ao consentimento livre, sério e informado, como causa grave dano espiritual, tendo em vista que diversos ancestrais estão enterrados no local, que sempre foi seu território desde o primeiro contato com os não-indígenas”, disse o defensor regional de Direitos Humanos Renan Sotto-Mayor ao G1.
De acordo com o procurador, tanto a empresa quanto a Funai e o Estado de Mato Grosso estariam impedindo a participação dos indígenas, fazendo com que os povos tradicionais acabem por arcar com o ônus do empreendimento, que são os impactos negativos que a obra trará para o seu entorno.
Entenda o caso
Após o recebimento dos relatórios do Iphan e realização de perícias, o MPF fez uma recomendação com o mesmo teor da ação à empresa Rumo, à Funai e à Sema, mas todos se recusarem a atender, alegando que a consulta prévia às comunidades não preenche requisito legal e que estão seguindo a Portaria Interministerial 60/2015, que estipula uma distância mínima de 10 km das terras indígenas para viabilidade do empreendimento.
Mas, para o MPF, a portaria interministerial 60/2015 é inconstitucional e a expedição de licença sem consulta prévia aos indígenas impactados contraria normas internacionais como a Convenção 169 da OIT e normas da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
Além disso, a distância mínima do empreendimento precisa ser definida de forma individual e as características peculiares desse caso precisam ser observadas para evitar um dano irreparável aos povos da região.