Uma das grandes riquezas do Cerrado, que ocupa quase 25% do território brasileiro não é visível acima do solo, pois está em porção subterrânea. As raízes da vegetação no bioma alcançam até 15 metros de profundidade. Funcionam como “braços” que se esticam para chegar aos lençóis freáticos debaixo da terra, garantindo a vida durante o período de seca. Essa característica faz com que o Cerrado guarde, no subsolo, até cinco vezes mais carbono do que a sua biomassa “aérea”. É o inverso do conceito de floresta, nos quais troncos e galhos guardam mais carbono que as raízes.As informações são do jornal O Globo.
Um estudo recente realizado por centros de pesquisa em 21 pontos diferentes do País revelou que o bioma estoca, em média, 143 toneladas de carbono por hectare, incluído aquele abaixo do solo. Por isso, o desmatamento acende um alerta, uma vez que a atividade econômica se instala derrubando árvores para dar lugar a agricultura de monocultura ou pastagens extensivas, que emitem mais CO₂.
Na opinião de ambientalistas, o agronegócio se concentra, atualmente, em garantir a expansão da produção à base do desmatamento no bioma.
“Nós chamamos isso de spillover e já vimos ocorrer no passado: quando o desmate cai na Amazônia, aumenta no Cerrado”, disse pondera a pesquisadora Bárbara Zimbres, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).
Juntamente com outros cientistas, ela está se articulando para exigir do poder público o cumprimento da promessa de incluir o desmatamento zero do Cerrado na próxima Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC). Esse é o documento oficial do compromisso do país no Acordo de Paris para o clima global.
Mas Zimbres reconhece que não será fácil. Na Amazônia, por exemplo, a lei do Código Florestal impede o desmatamento de mais de 20% de propriedades privadas, no Cerrado, a área livre para conversão é de até 80%. Com a bancada ruralista numa composição bem articulada no Congresso Nacional, os cientistas têm pouca esperança de que a lei se torne favorável.
“Alguns setores do agronegócio consideram que o Cerrado deve ser um ‘bioma de sacrifício’, uma vegetação nativa que deve ser sacrificada para proteger os sistemas florestais. Mas o nome disso deveria ser ‘agrossuicídio’. A saúde do Cerrado é essencial para a agricultura na área”, revelou Mercedes Bustamante, professora da Universidade de Brasília (UnB) e uma das maiores especialistas no bioma.
Papel do solo
O papel do solo é um argumento importante para o cientistas defenderem a preservação do bioma. Quando uma área de savana é desmatada, o carbono subterrâneo que o terreno guarda não se decompõe imediatamente, e sua emissão pode ser evitada. Isso requer, entretanto, formas de cultivo diferentes da monocultura, que incluam práticas mais sustentáveis, como a integração entre lavoura e vegetação nativa.
“Há muito carbono estocado na matéria orgânica do solo do Cerrado. A liberação de gases estufa, então, não ocorre só no desmatamento. A depender da forma de cultivo do solo, depois você começa a perder carbono associado à matéria orgânica do solo”, explicou Bustamante.
Bárbara Zimbres endossou que é fundamental uma política robusta para frear a destruição do Cerrado. Caso a perda de vegetação nativa continuar alta, não serpa impossível que o foco nacional de emissões mude. Com o cenário seguindo o mesmo curso, daqui a alguns anos o Cerrado pode até se tornar um problema de emissões maior do que o desmate da Amazônia.