Por André Garcia
Para além dos crimes ambientais, o crime organizado na Amazônia pode emperrar a captação de recursos para o desenvolvimento da agropecuária na região. Em Mato Grosso, a conexão fica ilustrada por dois rankings nada positivos: o terceiro colocado no desmatamento no Estado, Aripuanã, também ocupa 10ª posição entre as cidades mais violentas do Brasil.
O dado é do Anuário Brasileiro de Segurança Pública e mostra que na cidade, com população de 23.067 habitantes, a taxa média de mortes violentas intencionais é de 118,7. O cálculo considera 100 assassinatos por 100 mil habitantes.
Voltando à questão ambiental, o desmatamento no município chegou a 14.062 hectares em 2021, de acordo com levantamento do MapBiomas. A situação é pior na vizinha Colniza, cabeça da lista: 23.250 hectares desmatados, uma média de 46,2 hectares diária. Na segunda colocação, Nova Bandeirante derrubou 14.419,2 hectares.
Nas três cidades, o cenário socioeconômico é parecido e comprova o diagnóstico do Anuário, elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública: 10 das 30 cidades mais violentas do país estão na Amazônia. Do ponto de vista da captação de recursos, assunto que vem sendo amplamente abordado pelo Governo do Estado, o dado é péssimo.
Ou seja, o prejuízo do atual quadro de violência não é apenas social, mas econômico. Durante a Conferência das Nações Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (COP-27), que ocorreu em novembro no Egito, a presidente e co-fundadora do Grupo Igarapé, Ilona Szabó de Carvalho, explicou a situação.
“Se o custo para investimentos no Brasil já é alto para quem negocia dentro da lei, o custo Amazônia está mais alto ainda, porque está ligado a questões de criminalidade ambiental, que hoje está ligada à criminalidade organizada. Isso faz com que empresas deixem de investir no bioma por questões de reputação.”
Isso porque nenhuma empresa quer ter sua imagem associada ao crime.
“Para a nova economia verde, que tem critérios ESG muito mais altos, a conta não vai fechar e vamos ser prejudicados ou por um ambiente que não estava mapeado ou porque não houve negociação com o poder público para que ele cumprisse sua parte.”
Criminalidade
De acordo com o Anuário, o desmatamento, o garimpo ilegal, a corrupção, a criminalidade e a intensa presença de milícias e facções do crime organizado são os principais problemas na região amazônica.
Com mais de duas dezenas de organizações regionais criminais e duas grandes facções (PCC e Comando Vermelho) que disputam as principais rotas nacionais e transnacionais do narcotráfico, a Amazônia brasileira foi transformada em palco de guerras que impactam fortemente os índices de violência letal em toda a região e do país.
Em um momento que muito se fala sobre preservação ambiental e sobre um novo modelo de desenvolvimento econômico e social para o bioma, os dados divulgados mostram que nenhum projeto conseguirá transformar a região sem que, antes, o crime e a violência sejam vigorosamente enfrentados.
Agro sustentável pode mudar cenário
Ainda considerando os três maiores desmatadores do Estado, é possível citar algumas iniciativas, já contempladas com finanças estrangeiras, que podem contribuir para uma melhora no quadro ambiental e, consequentemente, social.
Os valores, ainda tímidos, resultam de aplicações da Alemanha e do Reino Unido, por meio do REM-MT, único investimento estrangeiro captado por Mato Grosso até o momento para compensação de iniciativas sustentáveis. Com resultados positivos, eles servem como casos de sucesso na busca por mais recursos.
Um exemplo é o Subprograma PIMS, desenvolvido junto à Empaer-MT. Com aplicação de R$ 4.257.168,77, as atividades visam otimizar sustentavelmente a capacidade produtiva da pecuária de corte tanto em Colniza quanto em Nova Bandeirantes.
Já o Biodiverso incentiva a cadeia socioprodutiva dos recursos naturais, entre os povos da floresta com investimento de 1.498.364,85.
Em Aripuanã, o projeto tem como objetivo implantar e monitorar Unidades de Referência Tecnológica (URTs) utilizando Sistemas Agroflorestais (SAF), tendo o cacau como cultivo principal, manejadas com tecnologias agroecológicas e de precisão, de forma participativa.
Importante destacar que estas e outras ações estão espalhadas por diferentes municípios da região. O objetivo de todas elas é melhorar a produtividade a partir do manejo, contribuindo para melhorar a renda, a qualidade da alimentação da família rural e a conservação ambiental.
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