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Sincronia entre Cerrado, Amazônia e Pantanal está sob ameaça da seca

Sincronia entre Cerrado, Amazônia e Pantanal está sob ameaça da secaRios voadores se deslocam em correntes atmosféricas. Foto: Reprodução Documentário Rios Voadores

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Por André Garcia

A seca prolongada que expôs a Amazônia a uma crise hídrica histórica em 2023 se repetiu no Cerrado e agora ameaça o Pantanal, onde as queimadas explodiram neste ano. O efeito em cadeia, é explicado pela relação de codependência entre os biomas vizinhos, que se abastecem mutuamente, tanto “bombeando” a água das bacias hidrográficas de um para o outro, quanto por meio dos rios voadores.

Nesta semana, quando se comemora o Dia Mundial da Água, o Gigante 163 traça um panorama hídrico da região e aponta caminhos para a sua manutenção, que também significa a manutenção do clima, do ciclo dos rios e da segurança econômica do Brasil. É o que explica à reportagem o pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e um dos maiores especialistas no país na área de mudanças ambientais globais, Carlos Nobre.

“Uma dinâmica muito complexa e muito perigosa é a degradação da Amazônia, que está ficando muito próxima de um ponto de não retorno. Isso também já começou a afetar o regime de chuva do Cerrado, principalmente no centro sul, que é a área mais desmatada do bioma.  Esse é um aspecto diretamente relacionado com o desmatamento.”

Na natureza, o ciclo da chuva normalmente começa no oceano: a água evapora, e a umidade é carregada até o continente. Depois da chuva, a água fica no subsolo ou nos rios e retorna para o oceano. Mas, na Amazônia, as próprias árvores absorvem a água e, ao transpirarem, devolvem a umidade para a atmosfera, fazendo chover levando massas de ar carregadas de vapor para o restante do País.

Estação Ecológica de Águas Emendadas. Foto: Tony Winston/Agência Brasília

De acordo com Nobre, cerca de metade da chuva na Amazônia é reciclada na própria floresta, antes de retornar ao oceano. Isso faz com que os rios voadores garantam as chuvas no Centro-Oeste e Sul do Brasil, permitindo a manutenção de rios e a irrigação de campos e plantações.

“A Floresta Amazônica recicla a água eficientemente. Por exemplo, lá para o lado de Rondônia, Acre. Peru, Bolívia 50% da chuva vem dessa reciclagem, da evaporação da água pela floresta. As secas extremas, como a de 2005, 2010, 2015, 2016 e agora a de 2023 fez uma diminuição desse transporte.”

O desequilíbrio desta castiga o Centro-Oeste. A severidade da seca já foi mensurada: 94% do território foi atingido pela estiagem, a maior porcentagem entre as regiões brasileiras. De acordo com Monitor de Secas da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), esta também é a única região onde o fenômeno se tornou mais intenso, com aumento excepcional de 1% entre dezembro de 2023 e janeiro de 2024.

O cenário é pior para os goianos e sul-mato-grossenses, que vêm seus estados entre os nove do Brasil onde a estiagem ficou mais intensa no período analisado. Conforme a última atualização do Monitor, Goiás tem 100% do território atingido pela seca, o maior índice desde outubro de 2022, também de 100%. A situação piorou com o aumento de 2% para 9% da área com seca grave, o que levou o Estado à condição mais severa desde julho de 2023, quando houve seca grave em 20% do território.

“Logicamente, um pouco da explicação dessa grande seca que o Cerrado enfrentou em outubro, novembro, dezembro, janeiro, fevereiro e março, também tem a ver com a redução do transporte de água pelos rios voadores que vem da Amazônia, que também bateu um recorde a seca mais forte do regime registro histórico”, afirma Nobre.

Em novembro de 2023 os governos de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul decretaram situação de emergência em razão de incêndios na região norte do Pantanal. Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Rota de crise na Amazônia

Um estudo publicado em janeiro deste ano mostra que a  mudança do clima, decorrente da ação humana, está por trás da seca histórica na bacia do rio Amazonas em 2023. O episódio reduziu o volume dos rios para níveis mínimos em mais de 120 anos de medição, secando por completo em alguns trechos e afetando rios tributários, o que impactou milhões de pessoas. Os cientistas identificaram que o aquecimento global tornou a seca que atingiu a região 30 vezes mais provável e que o aumento das temperaturas foi determinante para a intensidade e extensão do episódio.

A situação crítica do Rio Negro afetou a vida da população ribeirinha local e prejudicou o escoamento de grãos produzidos no centro do Brasil. Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Segundo os pesquisadores, os conjuntos de dados analisados indicam que o evento ‘excepcional’ e ‘devastador’, como o ocorrido no ano passado em larga escala, poderia ocorrer a cada 350 anos.

Em janeiro deste ano, mesmo após o início da estação chuvosa, a seca continua em partes da bacia do Rio Amazonas. De acordo com o Boletim de Monitoramento Hidrológico do Serviço Geológico do Brasil (SGB), embora tenham saído da classificação de seca, em geral, as cotas ainda estão abaixo da faixa de normalidade para o período.

Pantanal em risco

Já os rios da Bacia do Rio Paraguai, no Pantanal, registram níveis abaixo da média esperada para o mês de fevereiro, época de cheias na região. Os níveis estão abaixo da média em todos os principais afluentes – Alto Paraguai, Cuiabá, Taquari, Miranda, Palmeiras, Aquidauana. A falta de previsão de reversão do quadro para curto ou longo prazo anuncia uma das piores secas dos últimos anos.

“O Pantanal está ficando mais seco. Um estudo do MapBiomas mostra uma redução da área total de mais de 25% na área coberta de água nos últimos 30 anos. Isso mostra que o Pantanal evapora muito água e alimenta esses Rios voadores que descem para as outras regiões do Brasil.”

A situação também alimenta o fogo que consome o bioma. Conforme o programa Queimadas, do Inpe, os focos de incêndio no bioma aumentaram 1197%, nos três primeiros meses de 2024, tendo saltado de 42 para 545 em relação ao mesmo período do ano passado.

Crédito: Inpe

 

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