Por André Garcia
O MapBiomas aponta que 31,6% dos 199 milhões de hectares queimados no Brasil nas últimas décadas resultam da atividade humana, principalmente a agropecuária, que continua apostando no fogo como estratégia para baratear custos de produção e dar mais vigor ao pasto. Mas será que essa é mesmo a opção mais inteligente?
De acordo com especialistas ouvidos pelo Gigante 163, não. Isso significa que, mesmo que a queima controlada para manejo em áreas da Amazônia, Cerrado e Pantanal esteja proibida até o final do ano, as próximas ações precisam considerar uma nova realidade climática, com cenários cada vez mais secos.
“Muitos produtores ainda têm uma visão antiga de que a queimada melhora o pasto. Isso porque, visualmente, ela faz parecer que sim, já que quando o verde surge [em uma área queimada] o contraste é muito mais evidente do que o que se observa na palhada seca, por exemplo”, explicou o geógrafo e pesquisador do Instituto Gaia Pantanal, Clóvis Vailant.
A equação fica ainda mais desfavorável para o produtor se ele levar em consideração que temperaturas de até 700 graus podem esterilizar a camada superficial do solo, causando perdas de nutrientes quase irreparáveis. Uma eventual recuperação do solo nestas circunstâncias levaria pelo menos 40 anos.
Conforme projeção divulgada pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA) no ano passado, a reposição de nitrogênio por hectare demanda 1,8 mil quilos de ureia, o que custa cerca de R$ 4,5 mil. Ou seja, se um incêndio carboniza 100 hectares, apenas o custo do insumo, sem contar o gasto com a aplicação, se aproxima de R$ 500 mil.
Por outro lado, técnicas como a roçada seletiva, deixam o solo mais fértil. Feita por meio de roçadeiras manuais ou motorizadas, tratores ou animais de pastejo, ela garante o aproveitamento do material seco para compostagem ao mesmo tempo em que evita o acúmulo da vegetação que o gado não come.
“Deixar o que sobra de vegetação seca vai fazer com que o capim nasça com a mesma ou, às vezes, até com mais força. O que muda é o contraste visual, mas, no fim das contas, não tem diferença do ponto de vista da produtividade. A longo prazo, quando esse material orgânico vem se incorporando ao solo, acaba melhorando o pasto”, diz.
Mas esta não é a única alternativa. A rotação de culturas melhora a qualidade da terra e oferece a possibilidade de produção de cultivares que competem com plantas invasoras mais inflamáveis. Já o uso de forrageiras apropriadas a cada região, pode diminuir a proliferação de pragas e aumentar a retenção de água no solo.
A lista de alternativas também inclui a adoção de sistemas agropastoris, a divisão de invernadas, consorciação com leguminosas, banco de proteínas, dentre outras. Tudo isso serve tanto para as pequenas quanto para as grandes propriedades e pode ser feito com orientação de entidades como a Embrapa, por exemplo.
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