Por André Garcia
A atualização mais recente da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA), indicou 95% de chance de que o El Niño persista entre dezembro e fevereiro de 2024. O prolongado período de seca e calor intenso coloca em risco a próxima safra brasileira de grãos, que será uma das mais prejudicadas pelo fenômeno no mundo.
É o que aponta a Coface, consultoria internacional especializada em seguros de crédito e serviços de informação comercial. Segundo levantamento recente, o fenômeno deve comprometer a produção de commodities agrícolas, principalmente cereais, açúcar, óleo de palma e frutas cítricas, impactando, além do Brasil, países como Indonésia e Austrália.
“De fato, as perturbações terão um impacto negativo tanto na produção dos principais países exportadores (Austrália, Brasil, EUA) quanto nos pontos demográficos quentes que deveriam ser autossuficientes em alimentos (China, Índia). A pressão sobre os suprimentos, portanto, será dupla”, diz trecho do estudo.
Ou seja, colheitas mais pobres colocarão pressão nas cadeias de valor agroalimentares como um todo, e é provável que 2024 seja um ano de extrema tensão entre oferta e demanda para o setor.
Um levantamento da Consultoria Agro do Itaú publicado na quinta-feira, 24/8, reforça a preocupação ao mostrar que, em grande parte das regiões Centro-Oeste, Sudeste e no Matopiba, a estiagem e o calor predominaram entre junho e julho, reduzindo ainda mais o armazenamento de água no solo e agravando o déficit hídrico.
Diante do cenário, o banco estima uma queda de 2,3% na produção de milho e uma alta de 3% na de soja no Brasil para o ano que vem. Nas projeções do Itaú, o Produto Interno Bruto (PIB) do agronegócio deve registrar uma desaceleração importante: em 2024, o crescimento do setor deve ser de 2,5%, abaixo dos 12,3% projetados para este ano.
Inflação e instabilidade
A análise da Coface lembra que episódios do El Niño nos últimos 20 anos geralmente levaram a pressões inflacionárias nos preços dos alimentos, situação também prevista pela gestora de investimentos britânica Schroders, que exemplifica como os efeitos do fenômeno trazem aumento nos custos à cadeia produtiva do agro.
Além disso, ambas as consultorias destacam que países onde o setor agrícola é predominante podem sofrer perdas significativas de renda e emprego e que as dificuldades econômicas causadas pelas incertezas das condições climáticas devem criar um contexto de instabilidade social.
Recordes de temperatura
De acordo com o Serviço Nacional de Meteorologia, o aumento da temperatura oceânica pode chegar a até 1,8°C, o que caracterizaria um El Niño entre moderado e forte. Os resultados disso são sentidos na pele: o mês passado foi o julho mais quente já registrado no mundo, segundo o painel de mudanças climáticas Copernicus, da União Europeia.
Soma-se a isso, o fato de que o El Niño amplifica os efeitos negativos do aquecimento global, especialmente na Ásia-Pacífico, África do Sul e Leste e nas Américas. Ou seja, a partir de agora devem ser potencializados os casos de incêndios florestais, inundações e deslizamentos.
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