Vinicius Marques
Com os conflitos entre Rússia e Ucrânia, a questão da dependência internacional do Brasil em relação a fertilizantes ganhou ainda mais destaque. Os russos são responsáveis por fornecer cerca de 25% de insumos para adubos importados pelo País. Assim, enquanto alguns defendem a exploração de novas jazidas minerais na Amazônia, vizinhas a terras indígenas, como possível prevenção à crise do setor, especialistas afirmam que a cadeia é complexa e exige análise mais aprofundada.
Para José Carlos Hausknecht, sócio diretor na MB Agro — empresa de consultoria do agronegócio fundada por José Roberto Mendonça de Barros e Luiz Carlos Mendonça de Barros —, promover a independência brasileira no setor é interessante, mas o caminho não é simples, rápido, muito menos barato.
Atualmente, há um projeto de lei (191/2020, do Poder Executivo) que regulamenta a exploração de recursos minerais, hídricos e orgânicos em reservas indígenas, permitindo assim a extração de matéria-prima como o potássio, para a fabricação de insumos agrícolas. O PL pode tramitar em regime de urgência na Câmara dos Deputados, depois que o presidente Jair Bolsonaro defendeu sua importância, na semana passada, para a segurança alimentar do Brasil.
Para Hausknecht, no entanto, “não é uma questão de simplesmente mudar uma lei ambiental que vai resolver o nosso problema”.
“Nós temos, por exemplo, outros produtos de fertilizante como o fósforo que não têm essa limitação, mas que, mesmo assim, não andam”, aponta o diretor da MB Agro. “Isso é resultado de pouco investimento, reservas minerais e jazidas em locais muito complicados, matéria-prima de baixa qualidade, além dos problemas logísticos e ambientais, que fazem com que tal exploração seja economicamente inviável” disse ele ao Gigante 163.
O ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega concorda com Hausknecht. E, mais, afirma que explorar terras indígenas é “ideia maluca”.
“Potássio também é encontrado em outras regiões, como países da África, Canadá. A ideia de explorar terras indígenas é maluca porque vai invadir terras protegidas pela Constituição, seria necessária uma medida legislativa, e tem que entender como funciona o mercado. É preciso saber se os empresários vão para lá. Depende do custo”, afirmou o ex-ministro ao UOL.
Hausknecht diz que aumentar a produção de fertilizantes dentro do País e, consequentemente, diminuir a importação da Rússia, acaba sendo importante em casos como esse, em que países exportadores se envolvem em situações que afetam a cadeia de exportação.
No entanto, para o agropecuarista brasileiro, a diferença entre ter o fertilizante produzido em terras brasileiras ou não é mínima. O maior benefício, em termos de gastos, seria a redução dos fretes, especialmente para produtores próximos às fábricas, mas o valor do insumo em si não seria um ganho relevante ao agronegócio. “O preço dos produtos é regido pelo mercado internacional, então naturalmente os custos não mudariam muito”, explica o economista.
Além do mais, segundo estudo feito por Hausknecht para a Agência Nacional para Difusão de Adubos (Anda), os fertilizantes vindos de fora acabam pagando menos impostos do que os produzidos aqui. Isso acaba afetando a competitividade entre os insumos nacionais e internacionais, desincentivando empresas a atuarem no Brasil.
“Tem que analisar onde estão os problemas, para entender como encontrar uma solução viável”, conclui Hausknecht. “É preciso pensar um pouco mais profundamente e aí sim fazer uma proposta que realmente traga competitividade ao setor.”
LEIA MAIS:
Caravana itinerante vai mostrar como aumentar eficiência de fertilizantes
Brasil tem fertilizante suficiente até outubro, garante Tereza Cristina
Tensão entre Rússia e Ucrânia pode afetar importação e exportação brasileiras
Árabes querem ampliar exportação de fertilizantes para o Brasil