Por André Garcia
Conhecida como “capital do agronegócio brasileiro”, Sorriso, no norte de Mato Grosso, é o maior município produtor de soja do mundo e o maior produtor nacional de milho. Em 2022, último ano com os dados já fechados, Sorriso atingiu R$ 11,5 bilhões em valor da produção, 1,4% do total nacional. Também teve o maior valor de produção em soja (R$ 5,8 bilhões) e de milho (R$ 4,2 bilhões).
Contudo, a combinação entre mudanças climáticas, El Niño e ondas de calor registradas em 2023 assombram a cidade com uma quebra de safra histórica e produtores já apontam que este será o ciclo “mais difícil dos últimos 40 anos.” O período coincide com o ano mais quente da história do planeta, segundo dados da Organização Meteorológica Mundial (OMM).
No Brasil, a média das temperaturas do ano ficou em 24,92ºC, sendo 0,69°C acima da média histórica de 1991/2020, que é de 24,23°C. Os efeitos disso sobre a lavoura trazem apreensão aos moradores. Se nos últimos anos o comércio local vivia em franca expansão, com a chegada de grandes redes e a instalação de empresas, hoje se pergunta qual será o impacto da virada no campo sobre os negócios.
O AgFeed esteve em Sorriso e registrou o panorama atual, que combina preocupação com prejuízos e expectativa de que os efeitos de uma safra ruim sejam passageiros. Do lado da produção, a expectativa é de uma colheita complicada. De acordo com Sadi Beledelli, produtor rural local e presidente do Sindicato Rural de Sorriso, a safra de 2023/24 será “diferente”.
Retração
Beledelli é gaúcho e, como muitos dos agricultores da região, desembarcou em Sorriso há 40 anos. Ele relembrou que entre os anos 1980 e 1990, os planos econômicos, como Collor e Bresser, dificultaram a colheita, mas pelo aspecto econômico e não produtivo. Por questões climáticas, a safra atual é a mais difícil, ou como ele mesmo disse: “a mais desafiadora dos últimos 40 anos”.
“Quando colhemos e vendemos uma saca de soja, pegamos o recurso e gastamos na cidade, investimos e pagamos o custo. Isso gera desenvolvimento, o dinheiro vai trocando de mão”, diz.
Ele lembra que novembro e dezembro, quando comumente a soja está se desenvolvendo e necessita de chuvas para o chamado “enchimento de grãos”, houve uma seca forte. Nestes meses, segundo o sistema Copernicus, foi registrado aumento na média de calor. De janeiro até novembro, a temperatura média registrada no planeta foi a maior já vista, com 1,46°C acima da temperatura média do período pré-industrial.
“Tem produtor que vai colher 25 sacas por hectare. Fechamos uma parte da minha fazenda com 38 sacas, 24 sacas a menos que a produção do ano passado, uma quebra muito expressiva que não paga o custo de produção. Teremos prejuízo com o plantio da soja”, disse.
Assim, após anos em alta, o preço dos grãos no mercado externo caiu a patamares próximos aos de antes da pandemia, o que aperta as margens dos produtores. Os empresários locais sentem a queda do movimento. É o que explica Alex Miranda, CEO da Plantae, empresa especializada em gestão de propriedades.
“Estávamos preparados para essa safra mais difícil. Como somos daqui, entendemos como funciona e, antes do clima, o preço do grão já havia caído e o dos insumos aumentou. Entendemos esse cenário, mas [o clima] afetou muito os negócios”, afirma Miranda.
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