Se ainda havia dúvida sobre a relação entre o uso de agrotóxicos e os casos de câncer entre trabalhadores rurais, a investida das multinacionais nos Estados Unidos não deixa nenhum questionamento. Lá, a gigante Bayer, detentora da marca Roundup, está por trás dos planos da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA, na sigla em inglês) que deverão inviabilizar processos indenizatórios.
Aliás, é curioso que a empresa empenhe esforços para impedir processos ao invés de investir em pesquisa e desenvolvimento de produtos mais seguros para a saúde e o meio ambiente.
Desde 2015, a Monsanto e a Bayer enfrentam mais de 160 mil processos relacionados ao Roundup, após a Agência Internacional de Pesquisa sobre Câncer da OMS classificar o glifosato como “provavelmente cancerígeno para humanos”. A maioria das ações acusa as empresas de não alertarem adequadamente sobre os riscos do produto, expondo trabalhadores rurais e consumidores a um perigo desconhecido. Para encerrar disputas judiciais, a Bayer já desembolsou cerca de US$ 11 bilhões, sem admitir qualquer irregularidade no uso do herbicida.
Indústria pressiona agência
Agora, um movimento apoiado pela Bayer junto à EPA pode limitar novas ações judiciais. Onze estados norte-americanos alinhados à indústria pressionam a agência para alterar a legislação e impedir que pesticidas sejam rotulados com advertências sobre riscos à saúde caso essas informações contradigam a avaliação da EPA.
No ano passado, legislaturas da Flórida, Idaho, Iowa e Missouri já apresentaram projetos de lei para proteger fabricantes de pesticidas contra ações judiciais. Embora essas propostas tenham sido rejeitadas, a indústria deve intensificar seus esforços este ano. A expectativa é que pelo menos 21 estados avancem com legislações para blindar empresas de agrotóxicos em 2025, e o Senado da Flórida já iniciou esse movimento.
Empresa atua politicamente
Enquanto isso, a Bayer continua atuando politicamente para proteger seus interesses. A empresa já investiu cerca de US$ 8,5 milhões em lobby nos EUA para garantir a “uniformidade da rotulagem de pesticidas”, impedindo que estados exijam alertas adicionais sobre riscos à saúde.
Mesmo sem uma decisão final da EPA sobre alterar a legislação dos rótulos, a batalha jurídica que se desenha pode afetar milhares de trabalhadores rurais expostos a agrotóxicos, especialmente em países que seguem a regulamentação norte-americana para essas substâncias.
No fim das contas, o que está em jogo não é apenas a reputação da Bayer, mas a saúde de milhões de pessoas. A decisão da EPA sobre o glifosato também indicará a abordagem do governo Donald Trump à regulamentação química.
Embora seu primeiro mandato tenha sido marcado pelo alinhamento com os interesses da indústria, sua retórica atual endossa a agenda MAHA (“Make America Healthy Again” – Tornar a América Saudável Novamente), de Robert F. Kennedy Jr., que defende mais transparência e revisão ética em projetos financiados pela indústria.