Por André Garcia
O calor extremo afetou a safra 23/24 e derrubou as estimativas da produção de grãos no Centro-Oeste. Para Goiás e Mato Grosso do Sul, o IBGE estima queda de 6%. Em Mato Grosso, a Associação dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja-MT) aponta que a perda para a soja pode chegar a 21%. Com o prejuízo, cresce a perspectiva de não pagamento de financiamentos pela Cédula de Produto Rural (CPR).
Mas, de acordo com o advogado Gabriel Coelho Cruz e Sousa, a seca e estiagem severas podem garantir a flexibilização na quitação desses débitos. Associado do Grupo ERS, especializado em recuperação judicial, ele explicou em artigo publicado nesta segunda-feira, 15/1, que estes eventos são definidos judicialmente como “casos fortuitos ou de força maior”, o que permite mitigar o cumprimento das obrigações legais.
“O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não eram possíveis evitar ou impedir. Portanto, a lei admite que, em casos imprevisíveis, é possível reavaliar a responsabilidade de cumprimento de determinadas obrigações”, pontua.
Gabriel, que atua em Cuiabá, reforça que o cenário climático que Mato Grosso amargou nesta última safra preenche, sem sombra de dúvidas, os critérios estabelecidos pela Legislação.
“Tal providência se torna ainda mais relevante quando se observa que apesar do fato climático inferir uma péssima produtividade das commodities no estado de Mato Grosso, o preço do grão continua com uma tendência de queda, ocasionada pela produção recorde na América do Sul, em clara aplicação da lei de oferta e demanda.”
Recuperação judicial
Segundo o advogado, no contexto de recuperação judicial, a Lei 8.929 (Lei da CPR) também possibilita a flexibilização de obrigações em casos de prejuízo causado pela crise climática. Contudo, a aplicação desse entendimento é controversa nos tribunais brasileiros, que divergem sobre a inclusão ou exclusão das CPRs nos processos de recuperação judicial.
Isso porque, trechos da norma apontam que certos créditos e garantias ligados à CPR com liquidação física, como antecipação de preço ou troca por insumos (barter), não estariam sujeitos aos efeitos da recuperação judicial, a menos que haja motivo de força maior ou caso fortuito que impeça o cumprimento da entrega do produto.
“Em um primeiro momento, o referido artigo prevê que não se sujeitariam aos efeitos da recuperação judicial os créditos e garantias cedulares de CPR com liquidação física e/ou barter. Mas, em sua parte final, o dispositivo é expresso ao regrar que a não sujeição dos créditos ocorreria salvo motivo de caso fortuito ou força maior que venha a impedir o cumprimento parcial ou total da entrega do produto vinculado”, destaca.
CRP
A CPR, ou Cédula de Produto Rural, é um título de crédito utilizado no Brasil para viabilizar financiamentos ao agronegócio. Essa cédula representa a promessa de entrega de produtos agrícolas ou animais ao credor.
O produtor rural emite a CPR como forma de garantir o pagamento de um empréstimo obtido para financiar suas atividades agrícolas. O título especifica a quantidade e qualidade dos produtos que serão entregues ao credor no futuro. Em caso de inadimplência, o credor tem o direito de receber os produtos especificados na cédula.
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