Por André Garcia
Apesar de ocupar 64% da área agropecuária do Brasil — o equivalente a quase duas vezes o território do Amazonas —, a pecuária responde por apenas 17% do valor bruto da produção do setor. Para driblar a ineficiência e alavancar o setor só existe um caminho: aumentar a produtividade e reduzir os impactos ambientais da atividade.
Segundo estudo do projeto Amazônia 2030 divulgado na última semana, essa transformação exige políticas públicas bem direcionadas, crédito rural sustentável e controle do desmatamento.
“Nos últimos 23 anos, a expansão da pecuária revela que é possível aumentar a produtividade e, ao mesmo tempo, reduzir o desmatamento por meio de incentivos práticos e controle ambiental. No entanto, falhas nas políticas públicas e privadas têm impedido um avanço mais rápido, amplo e duradouro”, diz trecho da pesquisa.
A análise da expansão da atividade entre 2000 e 2023 mostra ainda que 64% das pastagens (105 milhões de hectares) apresentam qualidade baixa ou intermediária. Além disso, o setor foi responsável por 51% das emissões de gases de efeito estufa do País, principalmente devido ao desmatamento.
“Quase metade dos pastos estão degradados enquanto o desmatamento para pecuária continua. Diante da intensificação da crise climática, especialmente da redução das chuvas, as oportunidades para o aproveitamento produtivo de pastagens degradadas tendem a se reduzir drasticamente”, ressalta o documento.
Desmatamento é o maior vilão
Os pesquisadores destacaram que no período a pecuária brasileira passou por avanços importantes na produtividade, impulsionada por incentivos econômicos e pressões ambientais. Essa melhora, contudo, ainda esbarra no desmatamento.
Políticas como o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm) e a Moratória da Soja reduziram o desmatamento em cerca de 80% entre 2003 e 2012, favorecendo práticas mais produtivas.
No entanto, o crescimento da atividade ainda pressiona a floresta: para cada hectare de pastagem reformado no Brasil, um hectare de floresta foi derrubado, e na Amazônia esse número sobe para 2,35 hectares. Em contrapartida, apenas 0,2% dos pastos degradados foram reformados.
Receita pra um setor mais sustentável
Apenas por meio de uma colaboração robusta e comprometida será possível mitigar os impactos ambientais da pecuária e desenvolver territórios onde ela ainda opera com baixa produtividade. Para começar, é preciso fortalecer o combate ao desmatamento e garantir a destinação correta de terras públicas.
Também é preciso condicionar o crédito rural a metas de produtividade e sustentabilidade, com assistência técnica para pequenos e médios produtores e direcionar infraestrutura e incentivos para áreas prioritárias, onde a recuperação de pastagens é mais viável.
De acordo com o projeto Amazônia 2030, outro ponto importante é ampliar a transparência na cadeia produtiva, garantindo rastreamento da origem do gado e maior comprometimento de frigoríficos e investidores com práticas sustentáveis.
“O aquecimento global segue leis físicas imutáveis: quanto maiores as emissões de gases do efeito estufa, mais rápidas e intensas serão as mudanças climáticas. Portanto, políticos e líderes empresariais não podem hesitar”, concluem os pesquisadores.
Crédito rural mal distribuído
A pesquisa também aponta que a oferta de crédito rural cresceu, mas permanece mal distribuída. Em 2023, apenas 23% dos recursos foram aplicados em produtividade, como recuperação de pastagens e inseminação artificial, enquanto a maior parte foi direcionada à compra de gado, sem metas ambientais ou produtivas robustas.
Com um estoque de R$ 1 trilhão em crédito privado subsidiado sem exigências sustentáveis, há ainda um enorme potencial para alavancar práticas mais responsáveis no setor.
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